5. Camões lírico – A lírica clássica – A medida nova

As formas e os temas da lírica clássica

Teve influência da escola renascentista italiana em que Camões compõe a forma mais perfeita de sua lírica. Com os decassílabos e com as formas fixas do Classicismo que ele aprende o alto equilíbrio entre a disciplina, o virtuosismo formal e a reflexão sobre o sentido do amor e da vida. Tudo o que Camões pensa, ele diz, é um poeta-filósofo, mostra o que sente principalmente em relação ao que havia sofrido por causa de suas desavenças amorosas.

O Soneto

Contém 14 versos que são dispostos em 4 estrofes; 2 quartetos e 2 tercetos. Existe outro tipo de soneto que é o petrarquiano que contém rimas no sistema ABBA, ABBA, nos quartetos (rimas interpoladas ou opostas), e CDC, DCD nos tercetos (rimas intercaladas ou alternadas), mas o mais comum nos tercetos são três rimas alternadas no esquema CDE, CDE, lembrando que esse soneto é composto por decassílabos, onde o último verso, deve fechar a composição de modo que sintetize o desenvolvimento do soneto, onde esse verso é chamado de chave de ouro. 

Texto I

O neoplatonismo

A “reminiscência” amorosa – A saudade metafísica – O real e o ideal – O tempo e a eternidade.

A poesia de Camões é influenciada pelas várias filosofias de Platão e passou pelo cristianismo na Idade Média por Santo Agostinho, sendo um poeta-filósofo. Existem três aspectos de teoria platônica em projeção na lírica camoniana, vejamos:

1. A preexistência da alma

Platão diz que as almas são criadas pelo Demiurgo (nome dado ao criador do homem), diz que cada um foi colocada em sua “estrela” por isso conhecem as verdades eternas, a beleza absoluta, os arquétipos de todas as coisas. O criador do homem da todas as almas humanas aos deuses da Terra e dos Planetas que os cobre com um corpo, que guardam a “saudade” da contemplação da Verdade e da Beleza absolutas.

2. A reminiscência

A doutrina platônica diz que os sentidos não são causa, e sim uma ocasião do conhecimento. Diz que o objetivo dos sentidos é tornar os conhecimentos conscientes na alma, ou seja, os conhecimentos que foram absorvidos na estrela e esquecidos na encarnação.
Platão disse que tudo o que é insensível no mundo é uma cópia imperfeita de outro mundo que “vivíamos” antes de nascermos e que as coisas sensíveis são somente imagens da idéia e mais nada.

3. Do sensível à Idéia

Platão diz que as idéias são imagens imperfeitas da realidade que não muda e que a sensibilidade são meras sombras. Diz que a realidade é sem forma e sem cor que não pode ser tocada, e é também aquela que é contemplada pela inteligência e constitui a luz da alma. 

O paradoxo do amor – O amar e o querer

A mulher era vista como um ser sobrenatural, angelical que supre a alma e ajuda seus companheiros. Ex.: Laura que depois de morrer conduziu Petrarca às alturas. Muitas vezes ele faz uma união e um conflito entre o desejo carnal e o desejo ideal do amor desinteressado. Então o poeta pergunta em um soneto: “se o amor é algo, ou melhor, um feito da lama, como pode o amado querer ver corporalmente sua amada?”. Em Os Lusíadas na “Ilha dos Amores” e na écloga “As doces cantinelas que cantavam” que mostravam que a sexualidade era a principal força criadora da natureza. Camões faz com que o amor humano seja divino e praticado e que seja realizado. 

Texto I

Transforma-se o amador na cousa amada

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho logo mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si sómente pode descansar,
Pois consigo tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semidéia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim coa alma minha se conforma,

Está no pensamento como idéia;
[E] o vivo e puro amor de que sou feito,
Como matéria simples busca a forma
Esquema:

As rimas obedecem a um esquema que contém ABBA, ABBA, CDE, CDE

ADA = A
AR = B
AR = B
ADA = A

ADA = A
AR = B
AR = B
ADA = A

ÉIA = C
EITO = D
ORMA = E

ÉIA = C
EITO = D
ORMA = E

O “desconcerto do Mundo” ou o “mundo às avessas”

O desconcerto do mundo ou o mundo às avessas significa que há um mundo com um destino confuso e irracional que não corresponde aos anseios, os valores, a realidade objetiva e as razões. Essa obra de Camões provavelmente seja pré-barroca ou maneirista. O dogmatismo severo do catolicismo, que era contra-reformista, é comovido por uma grande convulsão, considerado prenunciadora do Barroco.

Texto II

O dia em que nasci moura e pereça

O dia em que nasci moura e pereça,
Não o queira jamais o tempo dar;
Não torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse nesse passo o Sol padeça.

A luz lhe falte, O Sol se [lhe] escureça,
Mostre o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,
A mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,
As lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem que o mundo já se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,
Que este dia deitou ao Mundo a vida
Mais desgraçada que jamais se viu!