É muito comum ouvirmos as pessoas dizerem que a prostituição é a profissão mais antiga da humanidade, mas a prostituição, como vemos hoje, é um “fenômeno essencialmente urbano”, surgido há menos de 2 séculos com o nascimento das grandes cidades, da classe dominante burguesa, do modelo de família monogâmica, e da noção de fidelidade que normatizou a sexualidade das pessoas.

Luiz Henrique Passador, Antropólogo social, nos lembra que essa família burguesa, que passou a ser o modelo para uma nova ordem sexual, onde o prazer permitido tornou-se o privado, o lar, e que nessa nova privacidade, a mulher foi confinada e “dessexualizada”, surgindo então, a figura mítica da “rainha do lar” cujo prazer passa a ser direcionado para o cuidado e a reprodução da família, que passou a ter a sua sexualidade controlada por questões morais de poder.

Nesse momento a virgindade ganhou o significado de pureza moral, ou seja, aquela que se guardou para um só homem, que controlou seus “instintos” e não se entregou à busca da satisfação de prazeres carnais e mundanos.

Assim, a prostituição e a prostituta passam a ser vistos como os opostos ao lar e à “rainha do lar”. É na prostituição onde a sexualidade insubmissa podia acontecer, associada às representações do impuro, da sujeira sexual – a “Boca do Lixo”! É nesse contexto que os homens podiam viver as fantasias irrealizáveis, os desejos proibidos no território do lar, locais com caráter lúdico e público – boates, bordéis, “zonas” e ruas.

A prostituição se apresenta ainda hoje, como uma alternativa momentânea à quebra da disciplina, principalmente em relacionamentos que preservam esse caráter machista do poder e do sexo.

É o território do prazer ilegítimo na vida cotidiana, onde muitos podem revelar suas fantasias e suas identidades sexuais mesmo que temporariamente desestruturadas sem que corram o risco de terem suas identidades sociais comprometidas retornando íntegros ao lar, a família, e ao trabalho, tal como romanceava Jorge Amado, no campo da literatura de ficção, um dos autores que privilegiam o estereótipo romanceado e humanizante da prostituta sábia, tolerante e acolhedora, e do bordel enquanto espaço de convívio social masculino.

Apesar de uma maior liberação sexual entre os jovens que buscam iniciar sua vida sexual com colegas ou namoradinhas, ainda hoje as profissionais do sexo fazem a iniciação sexual de muitos jovens.

Muitos homens procuram nessas profissionais a oportunidade de extravasar o desejo, de viver fantasias ou fetiches sexuais de uma forma imediata, principalmente, quando não se tem alguém para fazer sexo, ou também quando por uma educação repressora referente à sexualidade, esse homem e sua parceira tem um modelo de relacionamento onde não cabe o compartilhar de fantasias sexuais, a possibilidade de ousar.

Quando ouvimos falar de homens profissionais do sexo, conhecidos como garotos de programa ou michês, podemos levantar a hipótese de que as mulheres estão ousando ou reproduzindo um modelo masculino de vivenciar a erotização da sua sexualidade fora do contexto doméstico, mas essa idéia não confere com a realidade. É sabido que a clientela desses garotos de programa é composta na sua quase total maioria de homens, homo ou bissexuais, que buscam prazer e diversão com o sexo, nesse caso, pago.